Viabilidade
jurídica de alteração
de norma interna da empresa
Adriano Lorente Fabretti
Muitas são as empresas que possuem normas internas regulamentadoras
de direitos ou vantagens aos seus empregados, geralmente, não
previstos em lei ou em norma coletiva.
A concessão desses benefícios constitui mera
liberalidade das empresas, no entanto, criada uma política
interna a respeito de determinada situação, os
empregados dessa empresa incorporarão tais vantagem
aos seus contratos de trabalho.
Isto significa dizer que, criada uma determinada vantagem ou
benefício pela empresa, não decorrente de lei
ou convenção/acordo coletivo, elas não
mais poderão ser alteradas em detrimento dos empregados,
cujos contratos de trabalho estejam vigentes, sob pena de configuração
de alteração lesiva das condições
de trabalho.
As alterações lesivas das condições
de trabalho são, expressamente, vedadas pelo artigo
468 da CLT, sendo permitidas, tão-somente, as alterações
de mútuo consentimento e desde que não impliquem
em prejuízos diretos ou indiretos aos empregados.
Não é só, contudo. A alteração
e/ou supressão unilateral da vantagem e/ou benefício
caracteriza, ainda, violação ao direito adquirido
dos empregados, ferindo de morte, portanto, direito constitucional.
Esposando de igual entendimento, Francisco Antonio Oliveira1
afirma que:
""
Tem-se, também, que, à medida que o empregador
concede um benefício, este se amalgama ao contrato de
trabalho daqueles empregados que, à época, prestavam
serviços à empresa, e não poderá ser
retirado. O benefício, embora inicialmente constitua
liberalidade da empresa, após a concessão passa
a integrar o contrato. Daí para frente, ganha o status
de direito adquirido, e não poderá ser unilateralmente
retirado pelo empregador."" – negrito não
do original.
Importante salientar que ""direito adquirido"" não
significa, somente, aquele já consumado e usufruído
pelo empregado, mas também, aquele que já começou
a ser exercido, mas que por razões condicionais, tão-só,
poderá ser gozado posteriormente.
Por exemplo, digamos que a empresa resolva conceder uma complementação
de aposentadoria aos empregados que lhe prestarem serviços
por determinado período de tempo.
Mesmo que os empregados ainda não façam jus a
esta complementação da aposentadoria, seja porque
não preencheram as condições exigidas
pela lei, seja porque não têm o período
de trabalho exigido na norma interna, eles já iniciaram
a exercer seu direito e, portanto, já podem considerá-lo
incorporado ao seu patrimônio jurídico, de igual
modo àquele empregado que já tenha cumprido todos
os requisitos constantes da referida norma interna.
A título ilustrativo, interessante destacar o conceito
de direito adquirido previsto no § 2º do artigo 6º da
Lei de Introdução ao Código Civil (clique
aqui), in verbis:
""
Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral,
respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido
e a coisa julgada.
[...]
§
2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu
titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles
cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo,
ou condição pré-estabelecida inalterável,
a arbítrio de outrem."" (g.n.)
Logo, no caso do exemplo oferecido, tanto o empregado que preencheu
todos os requisitos exigidos para o pagamento da complementação
da aposentadoria, quanto àquele que presta serviços à empresa,
mas ainda não cumpriu nenhum deles, já possuem
um ""direito adquirido"" ao pagamento desta
complementação.
A proteção ao direito adquirido é de suma
relevância no ordenamento jurídico Brasileiro,
tanto que sua inviolabilidade foi elevada a esfera constitucional,
estando regulamentada pelo inciso XXXVI do artigo 5º da
CF/88.
Esta é a mesma linha de raciocínio compartilhada
pelo ilustre jurista Délio Maranhão2, que assim
dispôs a este respeito:
""
O regulamento é ato, originariamente, unilateral. Daí caber,
igualmente, ao empregador o direito de modificá-lo no
exercício do seu poder de comando. Acontece, porém,
que a esse regulamento aderem, tácita ou expressamente,
os empregados. E essa adesão torna bilaterais as cláusulas
regulamentares sobre condições de trabalho, que
passam, por isso, a integrar os contratos individuais, criando
para os empregados um direito contratualmente adquirido."" -
negrito não do original.
Diante disso, as alterações unilaterais de normas
internas das empresas que criem direitos aos empregados - apesar
de elaboradas por elas próprias e por mera liberalidade
sua -, somente poderão ser realizadas se não
originarem prejuízos direitos ou indiretos àqueles
que estejam com seus contratos de trabalho em vigor.
Por outro lado, os empregados admitidos pela empresa posteriormente à alteração
da norma
interna terão seus contratos de trabalho regidos pela
nova regra, não se aplicando a eles as regras antigas.
Apesar de vigorar na Justiça do Trabalho o princípio
do jus variandi ou do poder potestativo do empregador, este
sofre fortes restrições quando atingidos os direitos
dos empregados.
Desta forma, somente são válidas as alterações
unilaterais relativas à forma como seus serviços
serão prestados, os produtos serão fabricados,
dentre outras atinentes à parte técnica de seu
ramo de atividades. Destaque-se, também, que por mais
que esta proteção do direito dos empregados seja
importante para não se cometer abusos por parte das
empresas, ela limita o campo de atuação empresarial,
principalmente, para enfrentar os problemas decorrentes da
recessão do mercado, como os vividos atualmente.
Portanto, em razão de todo o aqui exposto, efetuada
a alteração lesiva pelas empresas, os empregados
têm grandes chances de revertê-la na Justiça
do Trabalho, desde que observado o prazo prescricional.
_______________
1 Comentários às súmulas do TST – 7ª edição – Editora
Revista dos Tribunais – 2007.
2 Instituições do Direito do Trabalho – Arnaldo
Sussekind, Délio Maranhão, Segadas Viana e Lima
Teixeira - Volume 1 –
Editora LTR – 18ª Edição – Pág.
541."
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